O tratamento do câncer de mama em mulheres idosas com tumores de baixo risco sempre gerou debates sobre a melhor abordagem pós-cirurgia conservadora. Nesse sentido, médicos discutem se medidas como a terapia endócrina e a radioterapia adjuvante são realmente as opções mais convenientes.
Foi pensando nisso que o estudo EUROPA, um ensaio clínico fase 3, trouxe respostas importantes ao comparar esses dois tratamentos, tomando como um dos parâmetros a qualidade de vida dos pacientes.
Os resultados preliminares, publicados no The Lancet Oncology, em janeiro de 2025, mostram que o tratamento com radiação foi associado a uma melhor preservação do bem-estar relatado em comparação com a terapia endócrina, além de provocar menos efeitos colaterais.
O desenho do estudo EUROPA
Para sustentar essa conclusão, os autores responsáveis pela pesquisa reuniram mulheres junto a 18 centros de tratamento de câncer de mama (quase todos na Itália, com exceção de um, que fica na Eslovênia).
O estudo era baseado em um método de não inferioridade. Isso significa que não foi utilizado um placebo, como acontece em investigações de fase 3, mas sim duas abordagens costumeiramente utilizadas nesses cenários. Assim, a intenção é comparar qual obtém melhor performance nas circunstâncias avaliadas.
Ao todo, foram recrutadas 731 pacientes que haviam sido diagnosticadas com um câncer de mama luminal A (ou seja, receptor hormonal positivo, HER2 negativo e progressão lenta das células) em estágio inicial. Todas elas tiveram como parte do tratamento uma cirurgia conservadora, que visava remover o tumor, mas preservar a maior parte do tecido da mama.
A partir desses dados, o artigo apresenta uma análise prévia das informações coletadas junto a dois subgrupos de mulheres.
- De um lado, estavam 104 pacientes (com mediana de idade de 75 anos) que receberam entre 5 e 15 doses de radioterapia adjuvante.
- De outro, foram reunidas 103 pacientes (com mediana de idade de 74 anos) que seguiram com a prescrição para o uso de um inibidor de aromatase ou tamoxifeno por períodos entre 5 e 10 anos.
O primeiro dos desfechos medidos foi a qualidade de vida por meio das respostas a questionários específicos sobre o tema depois de 24 meses. A análise foi feita quando 152 pacientes das amostras acima alcançaram esse marco temporal.
O estudo seguiu depois disso, mapeando outros indicadores (como a recorrência de tumores ipsilaterais, que se manifestam na mesma mama da neoplasia original) em 5 anos. Contudo, tais dados não foram apresentados nessa publicação parcial.
Os resultados obtidos na comparação entre endocrinoterapia e radioterapia adjuvante
No começo do acompanhamento, ambos os grupos tinham registros similares de indicadores de qualidade de vida.
Porém, após o recorte de tempo de dois anos depois do início do tratamento, o grupo da terapia endócrina apresentou uma queda significativa na qualidade de vida, com um declínio médio de 9,79 pontos na escala utilizada para medir tal indicador.
O grupo da radioterapia adjuvante teve uma queda menor, que ficou no patamar de 3,40 pontos. Assim, a diferença foi de 6,39 pontos, favorecendo o uso da radiação. Além disso, os dados mostram que:
- 85% das pacientes em terapia endócrina relataram eventos adversos relacionados ao tratamento.
- Já no grupo da terapia adjuvante, esse índice foi de 67%.
- A taxa de efeitos colaterais graves foi similar em ambos os grupos (15%).
- Nenhum óbito foi registrado no período.
No fim, 12% das mulheres interromperam a terapia endócrina devido a efeitos adversos, enquanto apenas 3% abandonaram a radioterapia adjuvante por conta desse motivo.
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Por que esses resultados são importantes
Na prática, esses dados podem fornecer insights importantes sobre o tratamento de mulheres idosas com câncer de mama luminal A de baixo risco.
O acompanhamento dessas pacientes deve sempre considerar que a qualidade de vida é um aspecto crucial na escolha do tratamento adequado, sobretudo em casos diagnosticados em estágios iniciais.
A terapia endócrina, embora eficaz, pode causar efeitos prolongados que comprometem significativamente a qualidade de vida das pacientes.
Com isso, a opção pela radioterapia adjuvante depois da cirurgia conservadora demonstrou ser uma alternativa com menos interrupções, menor impacto sobre o bem-estar e certamente mais viável para pacientes que não toleram os efeitos da terapia hormonal.
Contudo, o estudo possui limitações importantes. Ele é uma análise preliminar dentro de uma amostra maior e, portanto, aplica-se apenas à população específica estudada. Há ainda que se considerar a falta de dados sobre o acompanhamento no longo prazo, o que permitirá entender melhor se há impacto na sobrevida em cada opção terapêutica.
Para pacientes e médicos nessas circunstâncias, isso significa que a radioterapia adjuvante pode ser considerada, ainda que sejam necessários novos resultados para definir melhor o papel de cada modalidade terapêutica nesta população.
Aproveite e confira agora que fatores de risco podem aumentar a chance de desenvolver a fadiga pós-radioterapia.