Não é novidade que, de alguma forma, câncer de mama e obesidade estão conectados. Várias evidências mostram de que forma o excesso de peso corporal eleva o risco de desenvolver a doença ao longo da vida. Ainda assim, existem dúvidas sobre de que modo o acúmulo de gordura afeta o desenvolvimento do tumor em si.
Para tentar esclarecer esse ponto, um grupo de pesquisadores analisou amostras de tumores de mama ainda não tratados de mais de 2 mil mulheres, com diferentes faixas de índice de massa corporal, o IMC. No fim, o estudo publicado em meados de 2023, concluiu que as pacientes com IMC acima de 30 tinham mais indicadores de inflamação e mutações genéticas nas células do tumor em comparação com as mulheres mais magras.
Esses achados podem ser um primeiro passo importante para ampliar a compreensão sobre o impacto do excesso de gordura na evolução do tumor e no desenvolvimento de tratamentos cada vez mais personalizados, como você confere ao longo deste texto.
O que já se sabe a respeito da relação entre câncer de mama e obesidade?
Como já destacado, estar acima do peso aumenta a chance de desenvolver um câncer de mama. Tal fator tende a ser ainda mais preponderante depois da menopausa, que marca a última menstruação do ciclo reprodutivo da mulher.
Enquanto a mulher ainda não atingiu esse ponto, a maior parte do estrogênio do organismo é produzido pelos ovários. Por outro lado, quando a menopausa chega e os ovários deixam de produzir o hormônio, as células adiposas (ou seja, de gordura) assumem essa função, continuando a secretar o estrogênio. Quanto maior a presença de gordura, maior a chance desse processo desencadear um tumor nas mamas, já que alguns tipos de células cancerígenas dependem do hormônio para crescer.
Ao mesmo tempo, o excesso de peso também está associado a quadros de resistência à insulina. Ela acontece quando as células do organismo perdem a capacidade de usar esse hormônio secretado pelo pâncreas para usar a glicose como fonte de energia. Tal disfunção também parece contribuir para um risco maior de ter um câncer de mama ao longo da vida.
Ainda assim, a relação entre câncer de mama e obesidade tem várias camadas de complexidades. Fatores como a idade em que o ganho de massa corporal aconteceu e a localização da concentração de gordura também influenciam nesse cálculo.
De qualquer forma, os médicos geralmente tomam como referência para avaliação da composição corporal o IMC. Ele é obtido pela divisão do peso em quilos pelo quadrado da altura em centímetros. A partir desse resultado, considera-se que um IMC adequado oscila entre 18,5 e 24,9. Dos 25 aos 29,9, o número indica a presença de algum sobrepeso e acima de 30 configura-se um quadro de obesidade.
De que forma o peso corporal pode influenciar na evolução das células do tumor na mama?
Levando em conta justamente o IMC, as mais de 2 mil pacientes que compuseram a amostra do estudo foram divididas em grupos. Nenhuma delas estava abaixo do peso ideal (ou seja, com IMC inferior a 18,5). No entanto, mais da metade (51%) estava dentro da faixa considerada ideal para a sua composição corporal. Além disso, 33% foram classificadas com acima do peso e 16% estavam na faixa de IMC que caracteriza a obesidade.
Logo de cara, os pesquisadores concluíram que as mulheres no grupo daquelas com sobrepeso e obesidade tinham mais chances de terem sido diagnosticadas com tumores maiores ou ainda em estágio mais avançado. Tudo isso, em tese, diminui a chance de sucesso do tratamento.
Além disso, entre as pacientes com tumores com receptores hormonais positivos (que, grosso modo, fazem com as células cancerígenas sofram influência dos hormônios circulando pelo organismo) e HER2 negativo, um IMC maior afetava a predisposição para a presença de determinadas mutações genéticas e de quadros inflamatórios nessas células.
A maioria dessas alterações no código genético influencia a forma como as células do tumor se disseminam de acordo com evolução da doença. Tendências similares se repetiram com mulheres com outros tipos de tumor na mama (receptores hormonais negativos e HER positivos, por exemplo), ainda que as mutações identificadas variem caso a caso.
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Com todas as evidências coletadas, os autores do estudo puderam concluir que existem grandes chances de que, do ponto vista biológico, as células de um tumor na mama se comportem de forma diferente em mulheres com um maior acúmulo de peso.
No entanto, na prática, isso ainda não deve influenciar em muita coisa nas etapas seguintes do tratamento da doença. Os próprios pesquisadores reforçam no artigo que os achados apresentados são o primeiro passo para futuras novas investigações. Ou seja, novos estudos capazes de apontar direções que permitam que esse fator seja considerado na abordagem terapêutica adotada ainda precisam ser feitos.
Assim sendo, pode ser que no futuro a relação entre câncer de mama e obesidade permita o desenvolvimento e a implementação de tratamentos mais personalizados, que foquem nas alterações mais comuns identificadas em pacientes que estão acima do peso recomendado.
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